Juiz nega ação de Luciano Hang contra Felipe Neto e é atacado por empresário

Dizer que alguém está sendo acusado de um crime não equivale a dizer que alguém cometeu um crime. Com esse entendimento, o juiz Rubens Casara, da 43ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, negou queixa-crime do empresário Luciano Hang contra o youtuber Felipe Neto. A decisão é de 25 de março.

No Twitter, Felipe Neto criticou o empresário bolsonarista, dono da rede Havan, por supostamente falsificar o atestado de morte de sua mãe para não constar que ela tinha morrido em decorrência de complicações da Covid-19.

“Imagina o seguinte: sua mãe contrai Covid. Vc coloca ela num hospital da Prevent [Senior]. Ela recebe tratamento do kit Covid. Ela morre. Só q vc é tão obcecado pelo governo q vc falsifica o atestado de óbito dela… E sai por aí dizendo q ela só morreu pq NÃO recebeu o kit Covid”, disse o influenciador em uma primeira publicação.

“É exatamente isso que Luciano Hang, o Veio da Havan, está sendo acusado de ter feito. Ele terá que comparecer na CPI na próxima quarta-feira e vai ter q se explicar. Não parece ter mta saída…”, afirmou Felipe Neto em um segundo tweet.

Hang é apoiador do presidente Jair Bolsonaro e incentivador do chamado “tratamento precoce”, composto por medicamentos sem eficácia comprovada ou contraindicados para tratar a Covid-19. De acordo com dossiê elaborado por 15 médicos que afirmam ter trabalhado para a operadora de saúde Prevent Senior entregue à Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19, a declaração de óbito da mãe do empresário, Regina Hang, foi fraudada para omitir que ela morreu da doença após ter sido tratada com hidroxicloroquina, azitromicina, colchicina, ivermectina e tratamentos experimentais. A companhia nega irregularidades.

Luciano Hang apresentou queixa-crime contra Felipe Neto por calúnia. Em sua decisão, o juiz Rubens Casara apontou que o empresário não apontou dados concretos a indicar a existência de uma “imputação falsa de fato definido como crime”.

“Dizer que alguém está sendo ‘acusado’ de um fato criminoso, como fez o querelado [Felipe Neto], não equivale a dizer que alguém cometeu um fato definido como criminoso. Em matéria de tipicidade penal (ainda que ‘aparente’ e em cognição sumária), não se admite os fenômenos da analogia e da interpretação extensiva”, declarou o julgador.

Sem a imputação de “fato definido como crime”, não há o delito de calúnia nem é possível a instauração da queixa-crime, independentemente de a fonte das acusações propagadas pelo influenciador ser confiável ou não, avaliou o juiz.

“Vale insistir: impossível o recurso à analogia ou ao método de interpretação extensiva para justificar a persecução penal em desfavor do imputado. Em respeito ao princípio da tipicidade penal, não há como equiparar a afirmação de que alguém está sendo acusado por um crime com a conduta criminosa de imputar a prática de um fato definido como crime.”

Casara ressaltou que há limites à interpretação de um texto. E, no caso, o youtuber não pode ser penalmente perseguido por uma interpretação de Hang que não é respaldada pelos tweets. “A pessoa só pode ser punida pelo que faz, nunca pelo que alguém, mesmo que se sinta ofendido, acredita que o imputado quis fazer”, declarou o julgador.

Além disso, ele citou que as publicações não explicitam a “consciência e a vontade de caluniar” necessárias para a configuração da calúnia. E não é possível presumir a má-fé de Felipe Neto.

Rubens Casara também destacou que a queixa é inepta, pois não chega a expor “o fato criminoso, com todas as suas circunstâncias”, em desobediência ao artigo 41 do Código de Processo Penal. Isso porque a petição não esclarece a data em que teria ocorrido o suposto delito (há apenas a foto de um dos tweets em que a provável data da postagem pode ser vista) ou a data da ciência de Hang sobre esses fatos.

Por falta de justa causa para a ação penal e inépcia da inicial, o juiz negou a queixa-crime, com base no artigo 395, I e III, do Código de Processo Penal.

Ataques de empresário
Luciano Hang criticou, nas redes sociais, a decisão que negou sua queixa-crime contra Felipe Neto e atacou Rubens Casara.

“Soube pelas redes sociais que a queixa-crime apresentada contra @felipeneto, que alegou que eu teria falsificado o atestado de óbito da minha mãe, foi negada pelo juiz Rubens Roberto Rebello Casara, da 43ª Vara Criminal da comarca do Rio de Janeiro, contra o parecer favorável do Ministério Público. Para minha surpresa, ao pesquisar mais sobre magistrado, encontrei um ativista de esquerda nas redes sociais. E ainda, a esposa dele, @marciatiburi, foi candidata à Governadora no Rio de Janeiro pelo PT, nas eleições de 2018. Como podemos esperar uma decisão isenta de um juiz militante? Ele, no mínimo, deveria ter se declarado suspeito para o caso e passá-lo para outro colega de profissão.”

“Não dá para tomar decisões como essa, baseada em interesse próprio ideológico. É lamentável o que estão fazendo com o Brasil, onde a militância acontece dentro do Poder Judiciário, lugar que deveria prezar pela Justiça e Igualdade e Imparcialidade. A Justiça, neste caso, não é cega, esteve de olhos abertos o tempo todo. Ainda não fomos intimados da decisão, mas, adianto que vamos recorrer”, afirmou o empresário.

As “mensagens de teor ofensivo” de Hang dirigidas a Casara foram repudiadas pela Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj).

“Contrariado com recente decisão do magistrado, fundamentada em preceitos absolutamente legais, o empresário usou seus canais nas redes sociais para atacá-lo. Ao agir desta forma, Luciano Hang desrespeita o Poder Judiciário e demonstra desprezo pelo Estado Democrático de Direito. Decisões judiciais devem ser contestadas na forma normatizada pela legislação brasileira”, declarou a entidade.

By Revista Jus

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